Opinião

Boato e Cobardia

Os Imperadores romanos tinham uma característica pouco conhecida: eram adeptos de boatos e reconheciam nesse vil expediente uma arma poderosa para controlar a população ou destruir um adversário. Todos os Imperadores nomeavam diversos Delatores. Estes funcionários romanos tinham duas missões. Uma era misturarem-se com o Povo e recolher informação que reportavam diretamente ao Imperador, por forma a este inteirar-se das preocupações e dos anseios populares. Outra era espalharem boatos entre o povo com finalidades políticas, ou para engrandecer a glória do Imperador, ou para assassinar o caráter de um adversário de forma cobarde e caluniosa. O uso do boato e da intriga com finalidades políticas deve ser das profissões mais antigas do mundo, quase tão antiga como a outra. Ao longo dos séculos não faltaram constantes reinterpretações dessa tradição. Os períodos de guerra, pelo secretismo que envolve, sempre foram propícios a boatos. O progresso civilizacional não destruiu essa prática. Hoje os expedientes de disseminação são mais elaborados mas a lógica da narrativa é clássica e intemporal: o melhor dos boatos não pode ser uma mentira completa, deve ter pontos de contacto com a realidade. O visado deve ter sido visto no local ou nas proximidades do cenário principal da trama. As datas da ocorrência devem preceder por algumas semanas o início da difamação, para facilitar a validação da tramoia. As testemunhas e os factos devem ser cuidadosamente orquestrados para evitar o desmoronamento da historieta. A exposição pública é uma circunstância sensível que para alguns faz parte do quotidiano. Pode-se ser conhecido por bons ou menos bons motivos. Uma coisa é certa, infelizmente o reconhecimento público decorrente da atividade política é dos mais suscetíveis de gerar animosidades. Os historiadores dizem que essa tradição portuguesa é muito antiga. É pena que continuem a existir pessoas que prefiram recorrer ao boato e à cobardia para denegrir os seus adversários políticos, ou serão inimigos?